quarta-feira, 21 de julho de 2010

Posicionamento do Supremo Tribunal Federal acerca do Pacto San José da Costa Rica

O STF vem decidindo no sentido de que não há mais a possibilidade de prisão do depositário infiel, não tendo, contudo, reconhecido a impossibilidade da prisão por obrigação alimentícia, nem restringido o conceito de tal obrigação, para abarcar somente a pensão alimentícia, sendo assim, não há falar sobre tal impossibilidade, haja vista plena autorização da Constituição e a falta de limitação interpretativa pelo órgão jurídico competente.

Em recente decisão do STF acerca da prisão do depositário infiel, tivemos uma mudança no pensamento do Supremo no sentido de que a norma internacional[1] tem status de norma supralegal em nosso ordenamento jurídico, ficando entre as normas infraconstitucionais e a Constituição.

Assim, não se poderá decretar a prisão do depositário infiel (ressalte-se não ser o objetivo deste trabalho essa discussão, mas sim informar o entendimento vigente), mas tão-somente por quem inadimplir obrigação alimentar, é o que depreende do art.7º, nº 7 do Pacto San José da Costa Rica e da edição da Súmula Vinculante nº25.

“Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal

[...]

7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.” [não há grifos no original].

“Súmula Vinculante 25

É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.”

Entretanto, como não poderia deixar de ser, o entendimento atual do STF torna inaplicável a parte final do inciso LXVII do art. 5º da CRFB e a Súmula 619:

“LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;” [não há grifos no original].

Súmula 619

A prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, independentemente da propositura de ação de depósito.” [revogada]

Muito embora tenha havido tal mudança de entendimento, há, ainda, a possibilidade da prisão civil por dívida diversa daquela decorrente do inadimplemento da pensão alimentícia, pois, em uma interpretação hermenêutica constitucional, avaliando a interpretação do Supremo e a parte ainda aplicável do inciso LXVII, do art. 5º da CRFB, percebe-se, pois, que não houve, nem com a integração do PSJCR ao ordenamento jurídico brasileiro, a limitação da extensão da obrigação alimentícia, restringindo apenas para os casos de pensão alimentícia. O que se tem, assim, é a possibilidade da prisão civil do responsável pelo inadimplemento de obrigação alimentícia e, no aspecto ora tratado, referente ao salário.

Normas supralegais têm que estar em harmonia com a Constituição. Assim, se entendermos que somente no caso de pensão alimentícia é que está autorizada a prisão civil por tal dívida, o inciso LXVII do art. 5º da CRFB iria de encontro com o art. 7º, nº 7 do PSJCR, que possui status constitucional (§2º do art. 5º da CRFB):

“§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.” [não há grifos no original]

O ensinamento de Flávia Piovesan elucida, claramente, que: “[...] por força do art. 5°, § 2°, todos os tratados de direitos humanos, independentemente do ‘quorum’ de sua aprovação, são materialmente constitucionais, compondo o bloco de constitucionalidade.”[2]

De tal modo, teríamos um confronto de normas, que conectadas formam o bloco de constitucionalidade (que é a somatória daquilo que se adiciona à Constituição, em razão dos seus valores e princípios) devendo em casos como esse, ser utilizada a harmonização interpretativa constitucional.

Assim, o PSJCR tem o condão de contribuir com a interpretação do inciso LXVII do art. 5º da CRFB, a fim de que se demonstre a extensão do objetivo pelo qual o constituinte editou a norma, diante da ausência de limitação e da possibilidade extensiva de interpretação do termo “obrigação alimentícia”, de forma a abarcar em seu conteúdo o salário.



[1] "Deve-se recordar que o mais forte argumento adotado pelos reacionários de todos os países contra os direitos do homem, particularmente contra os direitos sociais, não é a sua falta de fundamento, mas a sua inexequibilidade. Quando se trata de enunciá-los, o acordo é obtido com relativa facilidade, independentemente do maior ou menor poder de convicção de seu fundamento absoluto; quando se trata de passar à ação, ainda que o fundamento seja inquestionável, começam as reservas e as oposições. O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político. Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados" [Não há grifos no original]. BOBBIO, Norberto. A Era do Direito, Editora Campos. 1992. p. 24/25.

[2] PIOSEVAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. Saraiva, 7ªed. 2006, p. 71/74.

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